domingo, 11 de março de 2007

O dogma do Planejamento Estratégico pode esvaziar sua visão gerencial

(Por Lucas Cassiano)
Reproduzo abaixo artigo que escrevi para a revista da Câmara Americana de Comércio de Porto Alegre/RS, visto que acredito ser mais uma forma de fomentar o debate sobre abertura criativa do pensamento estratégico.

"Para o presente artigo, o Planejamento Estratégico (PE) é um procedimento formal que visa a produzir um resultado articulado por escrito, na forma de um sistema integrado de decisões. O procedimento consiste em decompor, articular e racionalizar os processos pelos quais as decisões são tomadas e integradas nas empresas a fim de formar a estratégia empresarial. Ao final, resume-se a um trabalho escrito com objetivos, planos, cronograma e orçamento.

O PE é um dogma gerencial encarado como essencial ao sucesso de qualquer empreendimento. Você pode ser visto como louco ou dinossauro pelos "experts" se não possuir um PE em sua empresa. Sem essa ferramenta você estaria fora da moderna gestão empresarial.

Contudo, percebe-se que o PE das empresas serve mais para comunicar estratégias e decisões gerenciais do que para criá-las. Geralmente, estratégias e decisões estão preconcebidas na cabeça de alguns membros da empresa e sendo implementadas constantemente. Assim, o PE pode ser a codificação daquilo que já se fazia ou se pretende fazer na empresa, refletindo a visão e o aprendizado da organização, com todas as limitações que a codificação pode causar.

Porém, ao se utilizar o PE para criar visão - leia-se estratégia - corre-se o risco do esvaziamento da visão gerencial, pois a capacidade criativa dos gerentes e integrantes da organização é limitada por um plano escrito. Essa capacidade inventiva é restringida a um procedimento de decomposição da realidade em ameaças/oportunidades do ambiente e em potencialidades/fraquezas da empresa, que desprezam a intuição gerencial e o conhecimento de longos anos do negócio em favor de dados factuais e números de mercado.

Quando idéias, estratégias e visões restringem-se a este modelo mental distorcido do mundo, ignora-se parte da realidade da gestão empresarial: os empreendedores de sucesso caracterizam-se por muita ação e pouca formalização. Isto é a receita de seu sucesso que aprimora a visão e o conhecimento do negócio, capacitando-os a entender a complexidade dinâmica do mundo para além da fórmula simples do PE, que reduz em excesso a realidade. A visão, criação da imagem mental de onde se pretende chegar com o empreendimento, e o conhecimento do negócio são alargados e/ou obtidos através de trabalho árduo no plano operacional da empresa. O grande exemplo gaúcho de visão e conhecimento do negócio é a Gerdau, em que seu futuro presidente com 43 anos, André Gerdau Johannpeter, possui mais de 20 anos de experiência no grupo empresarial, pois a família tem um ritual de iniciação, que é começar, aos 16 anos, a operar a máquina de pregos.

Enfim, pessoas comprometidas com um ideal visionário, que conhecem seu negócio profundamente há anos, são mais relevante para o caminho do sucesso do que um plano formal escrito.

É interessante repensar o dogma prescritivo de que o PE é essencial para o sucesso e constitui a única forma de bem gerenciar. Em suma, a utilização dessa ferramenta deve atentar para uma forma prudente de comunicar e alargar a visão preconcebida da experiência e feeling gerencial, sob pena do dogmatismo e onisciência do PE esvaziarem, por meio de seu reducionismo da realidade, a capacidade gerencial de criar estratégias inovadoras."

Este artigo foi publicado na revista da Câmara Americana de Comércio AmchamNow - Porto Alegre - RS, edição de fevereiro de 2007, Ano I, n.º 08, pág. 16.

O presente artigo pretendeu despertar a idéia de que é possível gerir seu negócio para além de fórmulas prontas de estratégia, visto que, se a "moda do momento" é ser inovador e reinventor, será preciso não só gerir sua empresa, mas também repensar a própria gestão empresarial em vigor atualmente. Tenho percebido que a gestão empresarial brasileira está muito baseada nas fórmulas gerenciais norte-americanas, circunstância que coloca empresários, consultores e acadêmicos brasileiros na situação de meros seguidores das idéias norte-americas de gestão, marketing, etc. Talvez seja o momento de inventar o próprio estilo "tupiniquim" de administrar, fazer e estudar negócios, pois, como diz a literatura norte-americana de gestão, a vantagem competitiva é garantida aos líderes e não aos seguidores.

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